Para um povo caloroso como o brasileiro, que aproveita todas as ocasiões
para estar com a família e os amigos, e que valoriza a interação social em ambientes dos mais variados, como
clubes e igrejas, o isolamento
representa uma mudança radical. Nada disso estará disponível pelas próximas
semanas, seja por decisão governamental, seja por precaução de empresários e
líderes comunitários ou religiosos. Neste mesmo espaço, acabamos de lembrar que
a quarentena tem seus efeitos
psicológicos, atestados em estudos científicos realizados durante outros
surtos graves. É verdade que, segundo esses mesmos estudos, quando o isolamento é uma decisão própria –
o que vem sendo o caso brasileiro até agora (?)
–, e não algo imposto pelo Estado, esse
efeito é mitigado.
Mesmo assim, não é simples abrir mão da
interação social, e é aqui que criatividade e tecnologia devem se combinar
para manter um estado de ânimo que nos permita não apenas vencer o coronavírus,
mas fazê-lo como uma comunidade unida, de laços fortalecidos. Estamos em casa,
mas jamais sozinhos.
Quando a pandemia se for, que tenhamos um
mundo diferente, em que valorizemos
muito mais cada momento da liberdade de estar com as pessoas queridas.
Permanecer em casa, mesmo para aqueles
que levarão para suas residências a rotina de trabalho, significará uma oportunidade de fortalecer os laços familiares,
especialmente com a interrupção do período escolar de crianças e adolescentes.
Em quantos lares os horários de trabalho e de escola acabam significando que
cônjuges pouco se veem, que pais e filhos pouco interagem? Se acreditamos que a
família é o ambiente onde todos somos amados apenas pelo que somos, se
acreditamos que os filhos são valiosos – e não uma fonte de despesa ou desgaste
físico e emocional –, saberemos extrair
o máximo da nova rotina como oportunidade de aprofundar a vida em comum e o exercício
das virtudes. Aqueles que convivem com familiares idosos, que são o
principal grupo de risco para complicações da Covid-19, redescobrirão ou
reforçarão o valor do cuidado e do carinho para com pais e avós.
Felizmente,
a tecnologia vem em socorro das amizades. Nunca foi tão fácil conectar-se com
amigos, vivam a poucos quarteirões ou em outros países. Todos
temos uma genuína preocupação com aqueles que nos são caros, especialmente
os que vivem em regiões mais afetadas pelo surto. Esse pode ser o estímulo que faltava para um telefonema ou uma conversa em
vídeo, mas que não façamos da
pandemia nosso único assunto: saibamos compartilhar também as alegrias, as
experiências, os conhecimentos adquiridos durante esse tempo em casa.
E não nos esqueçamos daqueles que estão
passando pela mesma situação literalmente ao nosso lado, e dos quais às vezes
conhecemos tão pouco, ou quase nada. Quando italianos vão às janelas para
cantar à noite – hábito adotado até por profissionais, como o tenor italiano
Maurizio Marchini, que foi à varanda cantar Nessun Dorma, da ópera Turandot, em
Florença –, pouco importa se os vizinhos
são rostos conhecidos ou não. Estão todos unidos por uma mesma situação, da
qual querem emergir todos vencedores, como na frase final da ária de Puccini.
Quando
a pandemia se for – porque, mais cedo ou mais tarde, ela vai passar –, que
cidade, que país teremos? Que seja um mundo diferente, em que valorizemos muito
mais cada momento da liberdade de estar com as pessoas queridas: aquelas
com as quais dividimos o próprio teto, a rua, os interesses e afinidades. E que possamos lembrar destes dias como um
tempo em que um fortíssimo sentimento de UNIÃO nos ajudou a suportar o
isolamento físico.
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