Luciano Pires explica, por exemplo,o porquê de
slogans, como “L--- livre”, mesmo depois de condenado em
2a instância. Confira:
A imunização cognitiva
Luciano
Pires - 31/03/2016
O ano é 1995. Um vídeo escandaloso mostrado no
Jornal Nacional apresenta o bispo Edir Macedo ensinando sua equipe como tirar o
máximo de dinheiro dos fiéis. Se você não lembra, está aqui: https://www.youtube.com/watch?v=W7wqqJFtaYc .
Quando assisti àquelas imagens, pensei: o bispo
acabou… Passados 20 anos, o bispo e sua igreja nunca estiveram tão fortes, tão
ricos, tão poderosos. O escândalo veiculado no Jornal Nacional não destruiu nem
o bispo nem seu projeto, sua base de fiéis cresceu assustadoramente,
transformando a Igreja Universal num negócio bilionário, mesmo diante da
evidência dos fatos.
Coisas assim acontecem ao longo de toda história da
humanidade: grupos de pessoas que, mesmo diante das mais claras evidências de
perigo, de más intenções, de risco, permanecem seguindo líderes visionários,
malucos ou simplesmente desonestos. Como é possível que tanta gente se recuse a
ver a verdade?
Os estudiosos explicam com a
imunização
cognitiva.
Cognitiva vem de cognição, que é o processo de
aquisição do conhecimento, incluindo o pensar, a reflexão, a imaginação, a
atenção, raciocínio, memória, juízo, o discurso, a percepção visual e auditiva,
a aprendizagem, a consciência, as emoções. Envolve os processos mentais que
influenciam o comportamento de cada indivíduo.
A imunização cognitiva é um
escudo que permite que as pessoas se agarrem a valores e credos, mesmo que
fatos objetivos demonstrem que eles não correspondem à verdade. A pessoa
cognitivamente imunizada está no terreno da fé, que dispensa o raciocínio
lógico. Para ela, argumentos lógicos não têm relevância.
E então assistimos gente com estudo, inteligente,
articulada, que sabemos que não está tirando nenhum proveito material,
defendendo em público o indefensável. Como é que essas pessoas chegam a
esse ponto?Bem, existem ao menos cinco fases no processo de imunização
cognitiva.
Primeira fase: isolamento de quem tem opiniões
contrárias, protegendo suas ideias. A pessoa vai eliminando de
seu convívio ou mesmo de sua atenção, quem pensa diferente.
Segunda fase: redução da exposição às ideias
contrárias. Passa a ler e ouvir apenas as opiniões em linha com seus credos.
Nos estados totalitários, é quando a liberdade de expressão passa a ser
ameaçada, quando a imprensa perde a liberdade, quando vozes dissidentes são
caladas. É quando os processos educacionais adotam opiniões selecionadas, com
autores e textos cuidadosamente escolhidos para seguir apenas uma visão de
mundo.
Terceira fase: conexão dos credos a emoções
poderosas. Se você não seguir aquelas ideias, algo de ruim vai acontecer.
Lembra do “se você pecar, vai para o inferno”? Se você não votar naquele
candidato, sua vida, suas economias, seus benefícios estarão em perigo…
Quarta fase: associação a grupos que
trabalham para combater as ideias dos grupos contrários. Isso acontece não só
em política, mas até mesmo na ciência, quando métodos de investigação
científica focam nas fraquezas das teorias adversárias, ignorando os pontos
fortes.
Quinta fase: a repetição. Repetição, repetição,
repetição. Cria-se um tema, um slogan que materializa um determinado credo ou
visão, que passa a ser repetido como um mantra, numa técnica de aprendizado. O
grito “não vai ter golpe”, por exemplo, não é uma criação espontânea, obra do
acaso. É pensado, calculado. Sua repetição imuniza cognitivamente as pessoas
contra os argumentos a favor do impeachment.
Os especialistas em psicologia das massas sabem que
nossas mentes evoluíram muito mais para proteger nossos credos que para avaliar
o que é verdade e o que é mentira. E os especialistas em comunicação constroem
retóricas fantásticas, com intenção de desviar o tema principal e,
especialmente, imunizar cognitivamente os soldados da causa.
E aí, meu caro, minha cara, não adianta mostrar o
vídeo, o recibo, o cheque, o testemunho do caseiro, a ordem da transportadora,
o grampo telefônico… O imunizado cognitivo está vacinado contra fatos
objetivos.
Tá explicado então?
Se você está se sentindo
entorpecido das ideias,
incapaz de descer do muro,
provavelmente alguém está
lhe ministrando
umas doses de imunizante cognitivo.
E você nem percebeu que tá
dando "a grana pro bispo".
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