O governo Bolsonaro não precisa ter vergonha de ser de
direita.
Mas deve evitar a todo custo a radicalização.
É esse o traço que
desvia para os
caminhos do arbítrio e da supressão das liberdades
Em seu discurso no plenário do Congresso, Jair Bolsonaro
prometeu que "o Brasil voltará a ser um país livre de amarras
ideológicas". Não foi uma menção aleatória. Presente desde a campanha eleitoral,
a tal batalha contra as ideologias agora ocupa parte substancial das
preocupações do novo governo. As ideologias tornaram-se o grande inimigo a ser
vencido.
Em primeiro lugar, chama a atenção o tratamento impreciso do
termo ideologia. O presidente Jair Bolsonaro e seus adeptos usam a palavra
ideologia para se referir a todo pensamento alheio que difere do seu. Ideologia
seria toda ideia que eles acham equivocada. No parlatório do Palácio do
Planalto, Bolsonaro prometeu, por exemplo, "acabar com a ideologia que
defende bandidos e criminaliza policiais". Também se referiu ao
"grande desafio de enfrentar (...) a ideologização de nossas
crianças". Não se sabe bem a que se referia.
O emprego abusivo do termo ideologia remete à ideia de que o
novo governo seria isento ideologicamente. Os adversários é que teriam
ideologia, isto é, manifestariam uma visão enviesada e corrompida da realidade.
O governo Bolsonaro atuaria noutra dimensão, não ideológica. No entanto, o que
se vê no bolsonarismo, a despeito desse discurso de aparente neutralidade, é
uma atuação acentuadamente ideológica. É claro que toda ação política está
ancorada num determinado conjunto de ideias, valores, opiniões e crenças a
respeito do Estado, da sociedade e das pessoas. São justamente essas
características que o bolsonarismo evita definir quando se refere às suas
qualidades. Mas quando a ideologia é a do adversário, ela é definida como
socialismo, esquerdismo, etc., como se essas variedades da política fossem
irremediavelmente incompatíveis com o exercício democrático. Esse viés demanda
atenção e cuidados, uma vez que ele conduz, por definição, à prática
autoritária.
E a tal "ideologia" do bolsonarismo acaba sendo o
elemento definidor de tudo o que na administração da coisa pública acaba sendo
nocivo. Na escolha de vários ministros, por exemplo, mais do que a experiência
ou a capacidade técnica, o que importou foi o compartilhamento de ideias e
opiniões - a tal "ideologia".
Caso esdrúxulo ocorreu na Casa Civil. Sem apresentar nenhuma
razão técnica, o ministro Onyx Lorenzoni exonerou todos os 320 funcionários com
cargos comissionados de sua pasta. Disse que estava fazendo a
"despetização" do governo, admitindo, portanto, que agia com
critérios ideológicos. A "despetização" do governo é tão nefasta
quanto a "petização", pois a administração pública não deve se pautar
por questões ideológicas, e sim por critérios de ordem técnica e ética.
A ideologia também serviu de critério prioritário em algumas
manifestações do novo governo sobre política internacional. Por razões
ideológicas, alguns países foram excluídos do convite para a cerimônia de posse
do presidente Bolsonaro. Já em outros casos, a ideologia foi motivo de atitudes
que claramente contrariam o interesse nacional, como o anúncio de uma possível
mudança da embaixada brasileira em Israel.
Essa extremada ideologização do governo Bolsonaro contraria
parte significativa das propostas feitas pelo próprio governo na área
econômica, jurídica e administrativa. Se o presidente Jair Bolsonaro não
atalhar o quanto antes essa atuação baseada em critérios ideológicos, muito
rapidamente haverá conflito entre as áreas do governo. Por exemplo, as reformas
econômicas demandam critérios técnicos em sua aprovação e implantação. Não há
eficiência administrativa que resista à conferência de carteirinha partidária.
Ou não se faz a abertura comercial do País se a principal preocupação na área
internacional for atender a demandas de ordem religiosa de apoiadores do
governo.
O governo Bolsonaro não precisa ter vergonha de ser de
direita. Mas deve evitar a todo custo a radicalização. É esse o traço marcante
que desvia o conservadorismo - e também o progressismo - para os caminhos
tortuosos e sombrios do arbítrio e da supressão das liberdades. Lembre-se o
presidente Jair Bolsonaro que, no dia de sua posse, assumiu o compromisso de
"construir uma sociedade sem discriminação ou divisão".
Radicalização e 'ideologismo'
Partidos opositores - como o PT - prometeram (e cumpriram, o que foi coisa inédita), fazer boicote ao governo de Bolsonaro que os afastou da Presidência e dos cofres públicos (UFA!). No entanto, assim que no Ceará o banditismo começou a se 'pronunciar', queimando ônibus, destruindo passarela, o governador petista, que usou sua ideologia na posse do atual Presidente, pediu ajuda ao novo governo, que deixou a ideologia de lado e enviou sua ajuda nacional para reforçar a segurança do Estado. Dúvida: Seria incompetência do estado petista, falta de radicalização do governo federal ou as duas coisas?